Nassim Taleb e o Jiu-Jitsu: Antifragilidade no Tatame
Por Fabio Gurgel
Nassim Nicholas Taleb é um dos pensadores mais instigantes do nosso tempo.
Ex-trader, estatístico, filósofo e autor de livros como A Lógica do Cisne Negro e Antifrágil, ele defende que o mundo real — ao contrário dos modelos que tentamos impor sobre ele — é imprevisível, caótico e cheio de choques inesperados.
E mais: algumas coisas não apenas resistem ao caos, mas melhoram com ele.
A isso, ele deu o nome de antifragilidade.
O frágil quebra com o impacto.
O robusto resiste.
O antifrágil cresce quando pressionado.
No Jiu-Jitsu, não é difícil entender do que ele está falando.
A arte é, por natureza, um sistema antifrágil:
quanto mais testada, mais refinada.
Quanto mais contrariada, mais criativa.
Quanto mais pressionada, mais verdadeira.
Ensinar para ser forçado a evoluir
Tive a oportunidade de dar uma aula para Mark Ford, apresentado por um amigo em comum, Roberto Altenhofen — que também escreveu o prefácio do meu livro Inabalável.
Durante a conversa, Mark compartilhou um conceito marcante, que aparece também em seu livro The Big Black Book — onde, inclusive, ele teve a coragem de compartilhar abertamente seus métodos com os próprios concorrentes.
A ideia era simples e poderosa:
quando você treina com alguém inferior tecnicamente, é natural vencer com facilidade usando sua melhor posição — digamos, uma chave de braço.
Se repetir isso muitas vezes, você tem duas opções:
-
Continuar vencendo pelo caminho mais fácil.
-
Ensinar seu adversário a se defender.
Se você escolhe a segunda, força a si mesmo a descobrir uma nova forma de vencer.
Você melhora. Ele melhora.
E o ambiente se fortalece.
Essa é a dinâmica antifrágil em ação.
Compartilhar conhecimento, longe de te enfraquecer, te tira da zona de conforto e te obriga a evoluir.
O erro como ponto de virada
No Jiu-Jitsu, você está sempre enfrentando alguém que quer exatamente o contrário do que você deseja.
Isso significa que o erro é inevitável.
Mas também significa que cada erro carrega uma oportunidade:
ajustar, criar, adaptar, sobreviver.
Quando algo sai do plano, temos a chance de:
– travar, reclamar e parar.
– ou aprender, ajustar e reagir.
Quem se desenvolve no tatame é aquele que escolhe a segunda opção.
Porque sabe que as pequenas derrotas são lições disfarçadas.
E com o tempo, começa até a desejá-las — porque entende que só ali há real crescimento.
O tatame é caos que constrói
Taleb escreve que sistemas antifrágeis precisam de estresse para florescer.
Eles se alimentam do inesperado.
No Jiu-Jitsu, a técnica só amadurece quando testada contra a resistência real.
A calma só é treinada sob pressão.
A humildade só se revela após as quedas.
Você pode até repetir movimentos sozinho, mas a verdade do seu Jiu-Jitsu só aparece quando alguém tenta destruí-lo.
E é nesse campo imprevisível que a arte mostra sua grandeza:
ao invés de quebrar o praticante, ela o forma.
Conclusão
O Jiu-Jitsu não é frágil.
Não é estático.
Ele muda porque é testado.
E melhora porque insiste em existir sob tensão.
Se você treina, já sabe disso.
Você não melhora apesar da pressão.
Você melhora por causa dela.
O Jiu-Jitsu, como Taleb diria, não é robusto —
é antifrágil.