Viktor Frankl e o Jiu-Jitsu: O Sentido da Resistência

Viktor Frankl e o Jiu-Jitsu: O Sentido da Resistência

Por Fabio Gurgel

Viktor Frankl foi um psiquiatra austríaco, sobrevivente dos campos de concentração nazistas e fundador da logoterapia — uma abordagem terapêutica centrada na busca de sentido como força essencial da vida humana.
Seu livro mais conhecido, Em Busca de Sentido, se tornou um clássico da psicologia existencial, e uma obra transformadora para milhões de pessoas em todo o mundo.

Foi com uma frase desse livro que ele marcou a história:

“Quem tem um porquê, suporta qualquer como.”

Essa ideia ganhou corpo e verdade pra mim numa luta muito específica da minha trajetória: a final do torneio WVC III, um evento de Vale Tudo com oito lutadores.
Depois de duas lutas , cheguei à final contra Mark Kerr, que pesava 125 kg — eu, com 87 kg. A luta não tinha regras e duraria 30 minutos.

Aos 18 minutos, completamente exausto, perguntei ao meu corner quanto tempo faltava.
Na minha cabeça, a luta já deveria estar acabando. Mas, pra minha surpresa, ainda restavam 12 minutos.

Ali, vi uma bifurcação.
Eu poderia desistir, acabar com aquele sofrimento, e conviver com a sensação de ter cedido.
Ou poderia seguir, mesmo sem saber onde aquela escolha me levaria: seria nocauteado, finalizado, venceria? Não fazia ideia. Mas sabia que, se escolhesse continuar, não estaria sozinho — levaria comigo meus professores, meus ancestrais, meus heróis. Não poderia traí-los. Não poderia trair a mim mesmo.

E segui.

Não foi o placar que mudou minha vida. Foi a escolha de continuar, mesmo sem garantias.
Foi o momento em que a dor encontrou sentido.

A logoterapia no tatame

A logoterapia ensina que o ser humano não está condenado ao passado — ele é livre para agir no presente em direção ao futuro com sentido.

No Jiu-Jitsu, isso é realidade prática.
Errar é inevitável, mas permanecer preso ao erro é fatal.
O lutador que lamenta a queda anterior deixa de enxergar a próxima oportunidade.
O que age por impulso, sem propósito, se torna previsível e vulnerável.

Assim como Frankl nos ensina a não regredir diante da dor, o Jiu-Jitsu nos ensina a não congelar diante do erro.
A melhor jogada possível só acontece quando aceitamos o que passou e focamos no agora.

Sofrimento com propósito

Frankl sobreviveu a Auschwitz, mas foi além da sobrevivência: ele transformou seu sofrimento em contribuição.
O tatame, em sua escala, também nos oferece essa chance todos os dias.

A dor de um treino duro, o desconforto da pressão, o desgaste mental de repetir mil vezes o mesmo movimento — tudo isso tem valor quando está a serviço de algo maior.
E o que está em jogo não é apenas técnica, mas caráter.

A logoterapia pergunta:
“Pelo que vale a pena sofrer?”
O Jiu-Jitsu responde:
“Por aquilo que te transforma.”